QUANDO O ESPÍRITO BENFIQUISTA PREVALECE, NÃO HÁ DERROTA, CORRUPTO, MERCENÁRIO OU ARRUACEIRO QUE O CONSIGA APAGAR OU FAZER REGREDIR.
BENFIQUISMO É ESTADO DE ALMA SEM DEFINIÇÃO, PRIVILÉGIO DOS PUROS!

sábado, 4 de janeiro de 2014

ALERTA: NUNCA É DEMAIS LEMRAR,ESPECIALMENTE,TRANTANDO-SE DE CORRUPTOS


Aproveito para te enviar um texto que eu tirei do livro "Jogo Sujo" do Fernando Mendes, de que ninguém mais se lembra. É importante publicar isto um pouco antes do próximo jogo com os porcos uma vez que eles irão fazer o que costumam fazer nessas ocasiões.

Manuel

“Jogo Sujo”, por Fernando Mendes
 Fernando Mendes, nascido a 6 novembro de 1966, foi o único jogador que até agora teve a coragem para denunciar o uso do doping e a “estrutura” por detrás que permitia isso no seu livro “Jogo Sujo”. Foi o único jogador que jogou em todos os clubes que foram campeões nacionais.
Jogou no Sporting, Benfica (1989-91), Boavista (91-93), Estrela (93-94), Boavista (94-95), Belenenses (95-96), Porto (96-99).


A Minha História com o Doping
Infelizmente o doping é uma consequência natural da competição. É fundamental atingir grandes resultados, ganhar, voltar a ganhar e ganhar cada vez mais. Isto faz com que muitos clubes resolvam encurtar caminho através dos caminhos da ilegalidade.
“Ou tomas ou não jogas”. Se um jogador não quisesse tomar perderia o lugar para outro que aceitasse. Sem jogar via o seu valor futebolísitco diminuir algo que é muito grave numa carreira que é muito curta. Feita esta reflexão demoramos muito pouco tempo a aceitar.
No meu tempo o doping era tomado de duas formas, injecção ou comprimido. Podia ser antes do jogo, durante o intervalo ou com a partida a decorrer. A injecção tinha efeito imediato enquanto o comprimido tinha de ser tomado uma hora antes do jogo.

Existiam diferentes métodos e cada jogador tomava uma dose personalizada, mediante o seu peso, condição física do momento ou última vez que tinha ingerido a substância. Havia necessidade de gerir os ciclos  de cada atleta para diminuir o risco de ataque cardíaco provocado pelo excesso de droga. Porém, partidas contra adversários directos, eliminatóiras da Taça de Portugal ou jogos das competições europeias era sempre certo. Quando se sabia que não iria haver controle antidoping, nunca falhava.
Uma injecção demorava cinco minutos a fazer efeito. Com aquilo no corpo, corria mais rápido, saltava mais alto e parecia que nunca me cansava.
Mas como qualquer droga que se usa para aperfeiçoamento de determinada função, alguns jogadores chegavam a certa altura em que já não conseguiam jogar sem estar dopados.

A influência do doping no desempenho atlético era de tal forma poderosa que dei por mim a conseguir “performances” quase inacreditáveis. Lembro-me de um jogo das competições europeias (com o Boavista) contra uma equipa que tinha 3 campeões do mundo no seu plantel. Um deles era um poderoso avançado no jogo aéreo (Jorgen Klinsman). Sempre joguei a defesa esquerdo mas apanhei-o várias vezes no meu terreno de acção. Ele era um armário com um tremendo poder de impulsão. Mas eu nesse dia saltei que nem um louco e ganhei-lhe quase todas as bolas de cabeça. PARECIA QUE TINHA MOLAS NOS PÉS. A esta hora esse antigo atleta ainda se deve estar a perguntar como é que foi possível perder tantas bolas para um meia-leca naquele jogo. O segredo era uma pequena vacina, do tamanho de meia unha, chamada “PERVITIN”. Espetavam-nos aquilo no braço e dava para correr e saltar durante 4 jogos seguidos. (Uma pergunta que eu fazia a mim próprio muitas vezes, porque razão tantos jogadores têm os braços todos cheios de tatuagens? Para muitos deles é para esconder as “picas”). Eu é que estava alterado. Mas ainda assim fico contente por ter ganho porque esse momento foi histórico.

O doping tem duas faces. Por um lado dá força, dá para aguentar mais,  ajuda a ganhar. Provocava uma RAIVA ENORME que acompanhada pelas palestras dava-nos vontade de entrar em campo e corrermos loucamente.
No final de um jogo em que nos tínhamos dopado pedíamos um “anti-raiva” de modo a baixar a dose que tínhamos tomado. Mas mesmo assim com o anti-raiva ainda dava para correr até à meia noite. Ou então dava para o inverso, depressão, falta de paciência, isolamento.
O mais triste de tudo isto é a naturalidade com que um futebolista aprende a viver nesta situação miserável. Quando o massagista que nos dava a droga dizia-nos que era ilegal mas não nos avisava de eventuais perigos.

A “ORGANIZAÇÃO” NO NORTE DE PORTUGAL
Os jogadores eram peões neste enorme esquema chamado doping desportivo. Segundo constava as dosagens eram feitas em laboratórios no norte do país. Dizia-se também que esses laboratórios até tinham fachadas legais, mas dedicavam uma parte das instalações e dos seus rucursos humanos à investigação de novas dosagens que pudessem passar incólumes nos controlos antidoping. As pessoas desses laboratórios trabalhavam directamente com alguém do corpo clínico dos clubes. O estimulantes acabavam sempre nos balneários para serem testados.

OS JUNIORES COMO COBAIAS
O sistema de doping num dos clubes onde joguei era de tal forma elaborado que estendia as redes da sua perversidade para além do plantel senior. Em certos treinos aparecia um ou dois juniores para treinar connosco, mas não estavam ali porque eram bons, estavam ali para servirem de cobais a novas dosagens. Um elemento do corpo clínico dava cápsulas ou injecções com composições ilegais a miúdos dos juniores. Essas experiências não podiam ser feitas com jogadores seniores que jogam todos os domingos e que são os principais activos do clube. Se alguma coisa saisse mal saia caro. Além disso no futebol senior há controlos antidoping. Nos juniores os controlos acontecem uma vez na vida por isso era o ideal para fazer experiências.

Os juniores urinavam para dentro de um copo e essa urina iria servir para fazer os testes antidoping internos. Quando saiam os resultados alguém telefonava para os laboratórios dos subúrdios a dar as novidades, “Olha, isto acusou tanto, por isso temos de baixar a dose”. Ou então, “Não está a acusar nada, por isso podemos aumentar um bocadinho”.

Quando a dosagem era acertada, iniciava-se a produção em massa para o plantel sénior. Os júniores nem faziam ideia do que lhes davam pois diziam que era vitaminas e que a urina era para controlo interno e análises. Os júniores eram utilizados para melhorar o desempenho do plantel principal.

Durante os anos que andei no futebol profissional percebi da forma mais cruel que para ganhar vale quase tudo. “Não olhar a meios…”

O efeito de determinados estimulantes é que incutem uma RAIVA ENORME que pode ser uma grande ajuda quando andamos a correr e a despender um grande esforço durante o jogo.
Os clubes que usam estimulantes apenas se preocupam em escapar aos controlos antidoping. Mas os riscos são evitados através de várias artimanhas. Por vezes os departamentos médicos que utilizam estimulantes probidos controlam os jogadores para perceberem se o fármaco injectado noutro jogo já saiu do organismo.

Sempre ouvi dizer que em determinados clubes davam urina de terceiros a atletas dopados para que estes não acusassem nenhuma substância ilícita nos jogos em que havia controlo antidoping. Também achava estranho ver massagistas guardarem algálias (sondas ocas que se introduzem pela uretra até à bexiga) dentro das sua malinhas.
Outro desses truques eram as bolinhas frias utilizadas pelos médicos, muito em voga na primeira metade da minha carreira, através das quais se escolhia quais os jogadores que podiam ir ao controlo.

Os esquemas ardilosos podem mudar com a passagem dos anos, mas nunca deixam de existir. Eu não ficaria surpreendido se viessem a público situações semelhantes.
(Por acaso vieram, Casagrande, Deco, Carlo Alberto, Semedo, Emerson, tudo ex-jogadores do Porto).

O doping trouxe grandes benefícios a quase todos os envolvidos. Claro que a boa forma não se fica a dever apenas à utilização de estimulantes, não existe nenhuma fármaco que ensine a jogar futebol.

O PROGRAMA DA SIC, 30 de Maio de 1997.

O programa “Donos da Bola” da SIC exibe uma reportagem em que com recurso a uma câmara oculta um jornalista faz-se passar por um dirigente interessado em comprar alguns estupefacientes para que os seus jogadores possam correr mais. Estão a 2 jornadas do fim e precisam de ganhar esses jogos para garantir a manutenção. O jornalista consegue o contacto de um médico do Porto (Matosinbos) que tem fama de facilitar esse tipo de situações a clubes interessados (o famoso Póboas que foi agraciado com um lugar na Administração da SAD do FCP).
Esse médico recebe o pretenso dirigente na sua clínica privada em Matosinhos e é filmado em flagrante a vender-lhe uma caixa de comprimidos de Centramina por 40 contos (€200). Durante a conversa, o médico sem saber que está a ser filmado dá uma verdadeira lição sobre productos dopantes. Questionado pelo jornalista começa a falar em Pervitin. Usei várias vezes, era fortíssimo.    
Para além dos ensinamentos técnicos o clínico recorda a sua experiência num clube onde tinha trabalhado dois anos anteriores e revela contactos que lhe permite saber quando havia controlos anti-doping. “Como sabia sempre dos controlos aquilo era na boa. Andei a época toda a saber”.
O clínico salienta a importância de haver poucas pessoas com acesso ao balneário (o Porto desde sempre tem tido um controlo muito apertado. A tal “estrutra” e “organização” com gostam de lhe chamar serve para alguma coisa).
“Normalmente as coisas passam pelo massagista”. Os jogadores devem estar sozinhos no balneário com o massagista. Não devem lá estar nem treinadores nem dirigentes”.
“Numa situação dessas (urgência de resultados) convinha que uma grande parte do plantel tomasse”, continua.
Para convencer os atletas o clínico aconselhava que se mentisse, “pode meter o produto dentro de uma cápsula e dizer que é cafeína. A cafeína admite-se na boa”.
O médico fala também da cafeína que se vende em Espanha e que se chama “Durvitan” mas diz que este producto não serve para esta sutuação pois tem “um efeito retardado de oito horas”. A Centramina é o fármaco indicado, “os comprimidos tomam-se umahora e um quarto antes do jogo. Pode dar-lhes com café ou com água. Como são dois jogos quem tomar deve tomar dois de uma só vez”.
(Portanto, tudo numa boa)

Este aumento de quantidade é um lema desportivo que eu tive de viver, quanto maior o desafio maior a dose.

“Agora já não uso muito a cafeína. Quando há controlo uso uma coisa que os ciclistas me arranjaram. É o Ozotine, um imunomodulador. Melhora a parte respiratória. São umas ampolas com vários productos e mete-se cafeína também injectada, faz-se uma seringa com 10-15cc e depois cada jogador toma 1,5cc”.
Finalmente o médico deixa um conselho final, “É muito importante que os atletas sintam que está tudo controlado, que não há perigo dos atletas serem apanhados no controlo antidoping”.
E um remate final, “A base disto e também dos árbitros, porque isto não chega para meter golos, os árbitros também são importantes”.
(Claro, os árbitros, sempre)

Outro Clube

Noutro clube havia uma maior cuidado na administração de substâncias ilícitas e no receio de eventuais controlos anti-doping. Essa postura mais cautelosa resultava de uma maior capacidade de acesso a informação confidencial, como vim a saber durante a época. O médico também se gabava de ter alguém que o informava com antecedência dos jogos em que iria haver controlo anti-doping. Assim, se um jogo fosse ao domingo o médico sabia na 6ª ou no sábado quais as partidas que iriam estar sob a tutela do controlo antidoping.
Se não havia controlo havia estimulantes. Quando havia controlo, não havia.
O contacto dele devia ser muito eficaz porque das poucas vezes que fui controlado nunca acusou nada!!! Nem eu nem os meus colegas.

Nos tempos em que jogava ouvi muitas vezes falar que muito jogadores levavam urina de outras pessoas para o controlo de modo a não serem apanhados. Urinavam e no fim trocavam os frascos. Dizia-se que era habitual em alguns clubes.
Neste clube os jogadores tinham caminho livre para tomar as substâncias propostas pelo médico.

Os produtos ajudaram-me a fazer um das melhores épocas da minha carreira. (n.r. Fernando Mendes foi para o Belenenses com 28 anos e para o Porto com 29 anos). Nessa época já não era muito jovem e sabia que aquela seria uma grande oportunidade e poder vir a melhorar a minha situação desportiva. Para além do doping nessa época tinha um grande treinador e colegas com muita qualidade.
Em alguns clubes tomei Pervitin,Centramina, Ozotine, cafeína, entre muitas outras coisas de que nunca soube o nome. Também tive um médico que  nos dizia quando ia haver controlos.

E termina,

“Sim caros leitores, há doping no futebol português. Há muitos anos. Em vários clubes. Chega lá de diferentes formas, é testado de várias maneiras e é consumida apenas pelos atletas. Dá força, dá ressaca, dá alegria, dá angústia. É bom e é uma merda. Mas era melhor que não houvesse. Como era melhor que não houvesse árbitros comprados, dirigentes corruptos, jogadores violentos e adeptos doentes.

Nada se prova, ningém é preso, a impunidade é total. Não há homem justo ou bem intencionado que resista às redes do poder magalómano e criminoso que se vai instalando no futebol português através das mais variadas ramificações. O DOPING É APENAS UM DESSES TENTÀCULOS DO MAL QUE POLUEM A VERDADEIRA ESSÊNCIA DO JOGO.

Um jogador que consome estimulantes durante uma época inteira irá ter um momento de forte quebra física. O doping surge como uma forma de enganar o cansaço do corpo. Tem um efeito imediato mas mais tarde o atleta irá ressentir-se da violência muscular. Várias vezes observei equipas que estão com muita força na 1ª volta mas que na 2ª andam de rastos.

NOTA FINAL
Este livro é uma segunda versão  da obra incialmente escrita.  A primeira versão apontava nomes, locais e datas dos momentos mais sórdidos que aqui são relatados. Infelizmente, o clima de medo e de censura  instalado no futebol português  tornou impossível juridicamente  que essas mesmas pessoas fossem expostas, deixando esse primeiro livro condenado a viver numa gaveta.
As páginas que acabaram de ler, e das quais me orgulho, são frontais, verdadeiras, mas tiveram de ser generalizadas por causa de um SISTEMA PERVERSO  em que todos têm MEDO e vergonha de dar a cara e apontar o dedo aos responsáveis por situações ilegais e violadoras da ética desportiva.  Espero, no entanto, que depois destas páginas algumas pessoas que viveram  situações semelhantes possam vir a público contar a sua história. Aqueles que o fizerem estarão a prestar um serviço inestimável ao futebol português. Pode ser que, nessa altura,  a gaveta do primeiro livro se abra. E, acreditem, há muito mais para contar.

(Eu quando vejo os braços do Lucho e do Meireles, por exemplo, todos cheios de tatuagens não consigo deixar de pensar que todo aquele "fogo de artifício" deve ser mais do que uma mera questão estética).

Manuel

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