Por que perdeu o FCP?
(artigo de José Antunes de Sousa)
16:10 - 07-07-2015
No tradicional jogo de apostas no início da temporada que agora se consumou, praticamente todos os comentadores da bola embarcaram, à uma e sem pestanejar, na lancha da evidência: o Porto investira fortemente e exibia ponderosos e imbatíveis trunfos para a reconquista do ceptro nacional.
E nem a inexperiência do timoneiro em pelejas desta rijeza os fazia vacilar nas suas férvidas previsões: digamos que todos eles jogavam as fichas todas na casa do Dragão, o que, em linguagem do nosso povo, significa que eram «favas contadas».
Esta certeza, porém, viria, como sabemos, a revelar-se perigosamente incauta, pois que assentava imprevidentemente no primado exclusivo de uma certa lógica matemática, como se a mais jogadores de qualidade correspondesse uma equipa melhor, mas bem sabemos da Psicologia que o todo supera dinâmica e irreversivelmente a mera soma das partes que o integram. E, já agora, uma outra inadvertência: esqueceram que, mesmo assim, não basta a qualidade técnica para que uma equipa se revele melhor que outra – o que é decisivo é a qualidade do seu estado mental, estado esse que se obtem a partir da qualidade e do teor dos pensamentos e emoções que circulam no interior do grupo.
Então, por que perdeu, afinal, o FCP de forma tão enervante e traumática para todo o universo portista?
E aqui vai a primeira dose de veneno que o grupo avidamente engoliu, em clima de jubilosa cruzada: obrigou-se a ganhar. O Porto tinha que ganhar este campeonato! Esquecimento fatal: tudo o que se faz porque se tem que fazer o mais certo é que isso se não consiga mesmo fazer.
Mas houve mais veneno que todos os portistas se deleitaram em sorver: o do contra. Não se tratava simplesmente de ter sucesso – era contra, obsessivamente contra o Benfica que era imperioso tê-lo. Mas tudo a que se resiste persiste – como as bactérias da tuberculose que, combatidas maciçamente, regressam agora sob a forma reforçada de uma estirpe desconhecida de super-bactérias, deixando perplexas as autoridades sanitárias.
Mas há ainda mais veneno – que era insaciável a sede de vingança: o objectivo de tirar ao Benfica, a qualquer preço, o campeonato que, a ser ganho, representaria a tragédia da perda da tão cisosa hegemonia no futebol.
Eis os condimentos de uma receita letal: tirar e medo!
Tirar o título ao Benfica: quando se deseja muito algo não enquanto isso que genuinamente se deseja, mas enquanto algo que a outem se tira/rouba, é a si mesmo que acaba por tirar, porque a mente humana toma tudo à letra – ela não se pauta pela obediência aos princípios da lógica.
Medo: é o certificado de que se obtem sempre aquilo que se teme; ele é o atalho mais seguro e rápido para lograr uma desgraça – como a que acaba de acontecer ao FCP.
Mesmo assim, duvido que a lição tenha sido aprendida.
O Benfica, depois de muitas lágrimas, parece tê-la aprendido.
José Antunes de Sousa é doutorado em Filosofia pela Universidade Católica Portuguesa e é Professor na Universidade de Brasília
in A Bola
1 comentário:
Excelente texto. É que é mesmo isso sem tirar nem pôr, embora a filosofia não seja a minha praia!
E ainda não irá ser este ano que vão ganhar.
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