Um novo paradigma no negócio do
futebol
Por: João Marcelino
Um momento muito importante da alteração do
posicionamento da MEO quanto aos conteúdos desportivos deu-se com a
renegociação do contrato com a SporTV. Joaquim Oliveira tinha percebido a
intenção da Altice em baixar o pagamento pelos seus canais de desporto (como se
quer fazer agora com a SIC, reduzindo para metade os 20 milhões que a PT de
Zeinal Bava pagava a Pinto Balsemão) e traçou, como sempre, a estratégia
esperta. Com a NOS, a parceira na SporTV, decidiu o preço. A seguir foi à
Vodafone e à Cabovisão. Quando os franceses pretenderam falar já o preço estava
feito e não valia a pena espernear, embora a Altice ainda o tivesse tentado. A
alternativa para a MEO, nesse momento, era ficar sem o futebol (como os
círculos próximos de Oliveira começaram a fazer circular na imprensa amiga) e
enfrentar uma eventual deserção dos assinantes. Os mesmos que deram emprego aos
‘Gato Fedorento’ durante tantos anos. Por isso, Armando Pereira, o grande
accionista português da Altice, ‘self-made’ de Vieira do Minho, decidiu investir
contra o vizinho oriundo de Penafiel. Ia apostar no desporto, sendo candidato a
tudo, do Benfica aos direitos de todas as provas importantes, nem que fosse
para subir a parada, como agora mesmo também na Liga Inglesa, que a SporTV
acaba de recuperar por dez milhões de euros quando no último concurso os havia
perdido por três para a BTV.
O Benfica já tinha sido peça essencial da
afirmação da MEO, de Zeinal, face ao irmão desavindo da TV Cabo, de Rodrigo
Costa. Contra os interesses de Oliveira, que sempre convidava ambos para os
convívios de data redonda, prolongando à mesa as posições que assumira nas duas
operadoras para melhor cuidar dos seus interesses. O momento decisivo falhado
foi o da junção da PT com a ZON (hoje MEO) na SporTV, chumbada pela Autoridade
da Concorrência por força da lógica argumentação do Benfica de Luís Filipe Vieira
e da Liga de Clubes, à qual ainda presidia Mário Figueiredo, que Oliveira
demorou a conseguir fazer substituir por Luís Duque (e depois, contra a sua
vontade, mas por desejo de Pinto da Costa e Bruno de Carvalho, pelo ex-árbitro
Pedro Proença).
A Altice atacou o Benfica a fundo e aí acabou
a estratégia de centralização de direitos do futebol, a que o próprio Oliveira
já tinha aderido fazendo jus à velha máxima de que ‘se não os podes vencer
junta-te a eles’. A centralização tinha aparecido com Duque depois de muitas
horas de negociação nas instalações da velha Olivedesportos e sem a hostilidade
de Luís Filipe Vieira. “Vamos estudar, é possível”, tinha admitido o presidente
do Benfica. O importante era estabelecer os parâmetros da distribuição dos
dinheiros (onde o Benfica e FC Porto se prepararam durante meses para
ultrapassar definitivamente o Sporting, desenhando critérios à medida). Mas
tudo isso morreu no dia em que o Benfica garantiu o bi-campeonato e Pinto da
Costa interiorizou a ideia de que tal tinha acontecido pelo controlo da
arbitragem. Era preciso mudar. Aí, começaram a contar-se as espingardas.
Oliveira ficou entregue à lealdade que sempre pode contar com ele nos
momentos-chave e acabou por, a contragosto, deixar cair Duque para assumir o
preferido do FC Porto: Pedro Proença, o colega de estudos de Bruno de Carvalho.
Proença tem-se revelado “falho de capacidade
de gestão”, queixam-se alguns clubes, que também lhe notam falta de experiência
nas relações humanas. No dia 1 de Dezembro último, por exemplo, anulou na
véspera uma reunião com os dirigentes dos clubes da Liga para debater a
centralização. Decidiu ir a uma reunião a Paris quando já havia dirigentes a
dormir no Porto. E nessa altura já a MEO e a NOS estavam na recta final do seu
choque pelo Benfica. Proença nem percebeu que estava na véspera da morte da
desejada centralização dos direitos televisivos, importante sobretudo para os
clubes médios e mais pequenos, que inevitavelmente o vão passar a contestar.
Depois deste negócio do Benfica há duas
certezas: Oliveira vai perder em 2018 a sua ‘galinha dos ovos de ouro’, a PPTV
(que comprava direitos aos clubes para depois os revender à SporTV, onde também
já só tem 35%); e a sonhada centralização de direitos pela Liga de Clubes acaba
antes de começar – agora são os grandes operadores que pescam à linha e fazem o
preço. O negócio é entre distribuidores e produtores de conteúdos, dispensando
o intermediário criado na década de 80 pela RTP de José Eduardo Moniz, quando
este, curiosamente, dirigia uma televisão que não tinha concorrência. A
Altice/MEO já tem o Boavista e apresta-se para fechar o Belenenses. Diz-se que
a NOS/Sonae/Isabel dos Santos já terá o Marítimo, para além do Benfica. E a
luta prossegue, porventura até ao momento final de um acordo entre elas.
Não seria de admirar que o negócio do Benfica
acabasse por ser o auge e, ao mesmo tempo, o final das hostilidades e fizesse
sentar à mesa MEO e NOS para um dividir das despesas. Essa é uma hipótese muito
real que ajudaria a fechar o círculo e a dar ainda algum conforto à já
desgastada posição de Oliveira no mundo do futebol, onde a sua carreira de
intermediário de direitos acaba de vez em 2018, quanto terminarem todos os
contratos que ainda detém e já sem a sua famosa cláusula de preferência. Era
com essa cláusula na mão que durante 25 anos o dinheiro, intermediado pelas
suas garantias, ia dos bancos para os clubes renovando automaticamente os
contratos para além dos prazos de vigência dos dirigentes que os assinavam.
Esse tempo, em que Oliveira mandava com o dinheiro dos outros (os bancos),
passou à história com a mesma crise que já o obrigou a vender a posição na PT,
ter de sair dos Media (onde só ficou com a percentagem que funciona como
garantia da grande dívida que tem no BCP e BES/Novo Banco). De onde quis sair,
não teve permissão…
Neste negócio NOS/Benfica, Oliveira não foi,
no entanto, apanhado de surpresa. Sabia. E como sempre, optou pelo mal menor. O
pior seria a vitória da Altice. O ideal, para os seus interesses, será agora
que todos se fundam num acordo geral que coloque a Altice no lugar que a
Concorrência não permitiu à então PT e finalmente deixe a SporTV estancar a
perda de assinantes. Mas este processo só tem um grande vencedor: Luis Filipe
Vieira e o Benfica.
O valor de referência do futebol é agora
outro, como o presidente do Benfica sempre reivindicou. Os clubes tomaram
consciência do produto que têm nas mãos e a próxima grande batalha será travada
por FC Porto e Sporting. Pinto da Costa indexou no contrato com Oliveira os
valores a receber pelo seu clube ao que o Benfica viesse a conseguir. E as
dúvidas colocam-se: isso também é válido para este contrato Benfica/NOS? E se
for: os 85% do valor a dar ao FC Porto são sobre 40 milhões ou sobre 25? É que
não foi por acaso que o ‘exclusivo BTV’ foi avaliado neste contrato em 15
milhões autónomos… E o Sporting, o clube durante tantos anos entregue aos
‘amigos’ de Oliveira e Ricciardi, que ousaram pensar contratar José Couceiro
para presidente, levando-o a eleições contra Bruno de Carvalho, o que irá
fazer? O Sporting está na posição mais difícil e, para manter a competitividade
no futebol, não pode ficar quieto nesta batalha.
Vai ser muito interessante, do ponto de vista
económico e financeiro, acompanhar o futuro do negócio das transmissões
televisivas em Portugal. E, no perceber das pistas para esse percurso, há
perguntas para Miguel Almeida, presidente executivo da NOS, responder já na
conferência de imprensa programada para a próxima quinta-feira, 10, o dia em
que a Benfica TV completa 7 anos.
3 comentários:
Não dominando os meandros associados a esta temática, parece-me uma análise muito bem feita.
Parabéns e obrigado
Saudações Benfiquistas
eheheheheheeh! O baile continua.
Importante esclarecimento. Obrigado.
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